segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

consigna de 2016

disse o preto velho:
"a gente planta o que colhe"
ao invés de
"a gente colhe o que planta".
e é com esse enigma 
que adentro o ano.
sem muitos planos,
mas com confiança tanta.
talvez como quem se recolhe -
mas não se encolhe, se adianta.
e de onde quer que eu veja,
possa também como quem preveja,
retificar o que eu mesma já disse:
"a cada um conforme o que deseja
- e o que aguenta".
porque o que a gente tenta
tenta 
tenta
uma hora passa de madeira solta
a ser o banco
onde a gente
senta. 
oxalá!


terça-feira, 22 de dezembro de 2015

o que o olhar respira (da série: é preciso estar à altura da infância)



o que olha o menino
quando mira o infinito?
o que olha o menino
que traz atrás de si o próprio mito?
o que olha o menino?...
o que mira?...

ah, poder saber
o que esse olhar respira!

segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

citação (da série: é preciso saber ver pra poder ver)



“Se estivermos vigilantes, não passará um só dia sem que aconteça um milagre em nossa vida. Podemos inverter esta proposição, dizendo que, caso não nos aconteça um milagre em qualquer dia de nossa vida, será simplesmente porque o teremos perdido de vista.”
Rudolf Steiner

terça-feira, 24 de novembro de 2015

cabelo...capim (da série: é preciso ter coragem)

Cortei meu cabelo
como quem tira toda
a grama de um jardim.

Mas ele teima em crescer:
o cabelo em mim
é como na terra
o capim.

quinta-feira, 15 de outubro de 2015

milagres (da série: ehprecisotercoragemdeserfeliz...sempre!)

eu vejo milagres todos os dias.
milagres que ninguém vê.
eu vejo porque me abri à possibilidade de ver
e não só porque haja nisso uma alegria.

eu vejo milagres de repente, alhures,
aqui, ali e além.
eu vejo porque vejo mais do que eles contêm
e não só por crer (ainda que crer seja algo que por si já tudo mude).

eu vejo milagres e milagres e milagres
e milhares de milagres! mesmo que o mundo acabe.
eu vejo milagres porque sou eu mesma um deles:
talvez o maior, o melhor, o supimpa
mesmo sendo um mero, um nada, um reles...

(dedicado ao que abriga a casinha tianguá em todos os tempos, em todos os sonhos, em todos os lugares)

terça-feira, 6 de outubro de 2015

oferecida (da série: amores vizinhos)

ter a natureza perto de si
- ou, por outra, poder colocar-se próximo à natureza -
é, mais que um dom,
uma graça.

ontem a empregada de renatinha, a vizinha,
me deu um buquê de flores.
mirian é seu nome.

e de tal modo as flores
se fizeram presentes
que todos na casa
ficaram alegres
só com o
estar
nessa
proximidade.

grata sou, então,
pela graça
de renatinha ter como empregada
uma mirian
que me lembra que o mundo é,
mais do que a minha própria casa,
uma construção
muito
delicada.

quanto às flores
(aqui próximas,
me olhando,
enquanto teço
esta página),
elas são a própria
graça:
oferecida.

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

poemeto surgido à hora (de uma faxina, claro!) (da série: é preciso ter coragem de ser feliz!)

me compadeço
de quem ainda não descobriu
o bom do trabalho reprodutivo:
me compadeço
porque deixa de aprender
um tanto de coisa do campo afetivo.
me compadeço de quem
toma o público como meta:
não aprendeu ainda o quanto é bom
não ser nem alvo nem seta.
me compadeço,
me compadeço mas sigo.
quem puder, e quiser, que me acompanhe
(ou pare).

terça-feira, 18 de agosto de 2015

nada além do instante (da série: amores presentes)



não preciso me casar
com meus traumas.
não preciso fazer guerra
com a minha alma.
não preciso crer
nos meus medos,
não preciso me suicidar
porque a morte chega tarde ou cedo.


não preciso buscar
o que já tenho.
não preciso me apequenar
por saber que o que me rege é tremendo!
não preciso querer seguranças
que não se pode dar
nem estar “certa”
pra poder amar.


não preciso de nada além
do instante
onde desenho o tempo da delicadeza
que me devolve a mim
e, no encontro com o Outro,
me leva adiante.

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

ode ao amor (da série: é preciso ter coragem)

nada deporei contra o amor.
possa em quem eu o projetar
me encher de dissabor:
nada deporei contra o amor!

o amor é a coisa mais linda deste mundo.
o amor abre portas nunca antes imaginadas.
o amor cura feridas por demais cauterizadas.
o amor descortina, desenvenena, descerra, desvenda.

o amor é a única saída pra esse mundo.
o amor, só amor, salva.
e para o amor, o cotidiano mais simples
pode ser alvo do desejo mais profundo.

eu acolho o amor.
eu saúdo o amor.
eu sou grata ao amor.
eu sou amor.

terça-feira, 7 de julho de 2015

dor...me (da série: série nenhuma)

e o mundo dorme.
os gatinhos dormem.
os cachorros dormem.
os vizinhos dormem
e as vizinhas, creio eu, também...
o dia dorme
e a noite chega prenha,
como quem por ter a lua
fosse já avó!
a rua toda dorme.
o comércio dorme
mesmo que algumas lojas teimem
em não fechar.
os cinemas dormem
mesmo que as por assinatura
e os virtuais não cansem
de imagens circular...
a vila dorme.
a tianguá dorme.
acho que o mundo inteiro dorme
sabendo eu que inteiro é só mais uma imagem,
entre tantas, perdida...
a vida, será, que dorme?
talvez.
como antiga lembrança.
antigo amor.
antiga dor.
como tudo que
dor...
me.

quinta-feira, 18 de junho de 2015

do tempo e das cores do incerto (da série: série nenhuma)


um dia tão bonito!

um azul tão firme!

uma quase certeza no ar...

e no entanto, é tudo o mesmo.

ah, como muda

esse tempo interno

para quem o instante

é às vezes eterno,

para quem

o mutante

é não raro

decerto

para quem

o constante

tem as

cores

do

in

se

to.

(ops! 

do

in

cer

to

...)

quarta-feira, 17 de junho de 2015

sobre o tempo e o amor (da série: série nenhuma)



deixe ela.

deixe ela.

tudo tem seu tempo.



tão precioso esse silêncio.

tão precioso não ter um tostão!

tão precioso tudo.



aquilo que a gente escolhe

não deve ser preterido

só porque não se entende.



deixe o não entendimento chegar.

deixe ele assentar.

deixe ele descansar.

quando quiser, ele fala.

e aí tudo se transforma num clarão

tão grande

que a gente nem mais entende

é como é que não percebeu

tudo ali às claras!



deixe ela.

deixe ela.

tudo tem seu tempo.

até o tempo de nada ser.

tudo tem seu tempo.

terça-feira, 16 de junho de 2015

sobre os gatos do quindim (da série: é preciso ter coragem de ser feliz!)


que coisa inútil, os gatos!

comem, deitam, dormem.

por vezes, rolam uns sobre os outros,

brincam de gatinhos”...

comem-se também uns aos outros

e quanto barulho fazem,

deslocando telhas e alugando ouvidos!

às vezes simplesmente brigam

e devoram-se.

que coisa inútil!

um céu azul e um bando de gatos

de todos os tamanhos a se espraiar ao sol.

a indústria seria outra,

o desenvolvimento não teria fim

se se pudesse ao menos recrutar os gatos!

já imaginaram? toda uma população de felinos

que hoje se maltrata, se executa,

se dá fim,

transformada numa mola do progresso!

ôôô!

que coisa mais inútil, os gatos!



(ah, a inutilidade um dia!

a grata felicidade de não ter nenhuma serventia...)

quinta-feira, 14 de maio de 2015

tempos (da série: amores presentes)

tem o tempo de ficar e o tempo de ir.

tem o tempo de acalmar e o de se rir.

tem o tempo da plantação e o da colheita.

tem o tempo do improviso e o da receita.

tem o tempo de ser sério e o da fluidez.

tem o tempo da desiderada e o da sensatez.

tem o tempo de te amar e o do silêncio.

tem o tempo de ter tempo ― e o do movimento.

os dias (da série: é preciso ter coragem)

tem dias verdes, amarelados, vermelhos, cinzentos...

tem dias com coloração tão diversa

que até de mim mesma nem lembro.

tem dias que parecem meses,

tem dias que são como um segundo.

tem dias em que as graças viram revezes

e tem graças que num dia transformam o mundo.

tem tanto tipo de dia quanto os meus estados d'alma.

é por isso que recorro ao pensamento

de que cada dia quem faz sou eu, a cada momento

e isso é a única coisa que às vezes me salva.

terça-feira, 5 de maio de 2015

a história de uma Príncipa (da série: amores presentes)

Era uma vez uma Príncipa.
Príncipa, para quem não sabe, não é feminino de príncipe: é Príncipa e pronto.
Então.
Era uma vez uma Príncipa que nasceu sob a influência de uma deusa muito poderosa.
O nome dessa deusa é Vênus.
Ela é o amor, a beleza, a delicadeza e tudo isso Príncipa trazia,
só que tão, tão escondido, que nem mesmo ela sabia.

Um dia porque sempre há um dia, ou vários! Príncipa resolveu sair do seu reinado.
Assustou-se!
Até então, ela tinha sido cercada de todos os cuidados
e ela era o próprio cuidado: cuidava de si como quem sabe que para além do terreno,
há em cada qual um elemento mágico, profundo, divino, sereno.
Pois.
Príncipa que era só, e cercada de, cuidado, resolveu ir ao mundo.
E como já trazia a música como companheira,
foi através da música que ela fez ponte com as terras estrangeiras.
Nossa, como o mundo era grande!
Nossa, como dava medo!
Nossa, como se sentia insegura fora dos seus cercados e dos seus segredos!
Mas Príncipa, quando decidia algo, era intrépida.
E mesmo com todo o medo, com toda insegurança, com todo frio, com toda sua herança
nem sempre boa, às vezes pesada como o que nem ela mesma alcança... ―,
aventurou-se.

Foram tempos tortuosos.
Quanta coisa desmoronou!...
Quanto novo apareceu!!!!
Quanta sacrifício se viu!
Quanto prazer inesperado sucedeu...
Príncipa caiu muitas vezes doente,
pois quando a Alma sofre, o corpo é quem sente.
Teve, então, que recorrer ao que lhe era latente, mas que em algum ponto se perdeu.
E quase como uma águia que renasce das cinzas de si mesma 
ou como planta que secou por um descuido, mas que alguém lembrou e novamente aguou ,
ela fez-se outra: transformou-se como a borboleta!

Descobriu que era uma Príncipa!
E que Príncipas podem ser, para além de ter.
Riu-se dos possíveis que se abriam cada vez que vinha um novo amanhecer.
E ficou tão, tão mais bonita do que sempre fora, que tudo em volta parecia resplander
sua beleza, sua doçura, sua leveza.
Príncipa segue, então, a sua sina
e a sua sina não é outra senão escrever a própria história!
Não como quem desatina, mas como quem lê para além do que se traz na memória.
Príncipa perdeu o medo há mesmo quem diga que perdeu o juízo!...
A verdade é que Príncipa segue cada vez mais radiante (ou, eu diria, cada vez menos estranha)!
sem segurança alguma que a detenha,
sem castigo algum que a contenha:
simples como o próprio vento,
firme como uma montanha.

(para a Príncipa, em meio às muitas transcrições...rs)

quinta-feira, 26 de março de 2015

citação (da série: é preciso ter coragem)

                 
Vitória Nossa (Clarice Lispector)
                 "O que temos feito e a isso considerado vitória nossa de cada dia.

                 Não temos amado, acima de todas as coisas. Não temos aceito o que não se entende porque não queremos ser tolos. Temos amontoado coisas e seguranças por não nos termos, nem aos outros. Não temos tido nenhuma alegria que já não tenha sido catalogada. Temos construído catedrais e ficado do lado de fora, pois as catedrais que nós mesmos construímos tememos que sejam armadilhas. Não nos temos entregue a nós mesmos pois isso seria o começo de uma vida larga e talvez sem consolo. Temos evitado cair de joelho diante do primeiro que por amor diga: tenho medo. Temos organizado associações de pavor sorridente onde se serve a bebida com soda. Temos procurado salvar-nos, mas sem usar a palavra salvação para não nos envergonharmos de ser inocentes. Não temos usado a palavra amor para não termos de reconhecer sua contextura de amor e de ódio. Temos mantido em segredo a nossa morte. Temos disfarçado com amor nossa indiferença, disfarçado nossa indiferença com a angústia, disfarçado com o pequeno medo o grande medo maior. Não temos adorado, por termos a sensata mesquinhez de nos lembrarmos a tempo dos falsos deuses. Não temos sido ingênuos para não rirmos de nós mesmos e para que no fim do dia possamos dizer 'pelo menos não fui tolo', e assim não chorarmos antes de apagar a luz. Temos tido a certeza de que eu também e você também, e por isso todos sem saber se amam. Temos sorrido em público do que não sorrimos quando ficamos sozinhos. Temos chamado de fraqueza a nossa candura. Temo-nos temido um ao outro, acima de tudo. E a tudo isso temos considerado a vitória nossa de cada dia..."

quinta-feira, 12 de março de 2015

da arte de amar (da série: amores presentes)

deus ou deusas,
me permitam a aventura da paixão!
me permitam amar sem economia:
me permitam a poesia!
me permitam superar as sovinices,
as prevenções que só geram caduquices:
me permitam me jogar sem rede de proteção!

deus ou deusas,
me permitam a aventura de me dar!
me permitam dizer sim
sem achar que por isso tenha que em seguida dizer não:
me permitam ser o melhor de mim!
me permitam a admiração
a reverência
o respeito
a devoção
pelo ser que tenho à minha frente,
que me devolve a mim triste ou contente
e me permite deparar-me
com a minha própria e.moção!
me permitam demonstrar a boniteza 
que é gostar com a maior delicadeza
a despeito de
passado/futuro 
ou pre.tensão!

deus ou deusas,
me permitam
desfrutar do meu tesão!
me permitam ser feliz
neste presente!
me permitam mergulhar
no oceano que é o Outro
sem querer reduzi-lo
aos meus enganos
e enfeiá-lo com o que
tece a minha mente!
me permitam o encontro não marcado,
me permitam o atraso nos trabalhos,
me permitam a respiração de perto,
o sorriso aberto,
a des.contração!

deus ou deusas,
me permitam a ventura de quem vive!
que por esse e por todos os amores,
se absolva de todos os temores
quem se lance como em queda
ou voo livre!

amém!


sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

para os olhos (que não são) de azeviche (da série: amores por viver!)

os deuses (as deusas)
quando me instam,
eu obedeço!
nem tem essa
de ai ai ai:
é fazer o que alma
dita
sem qualquer desdita
porém
mas
todavia
vai-não-vai.

os deuses (as deusas)
nem me poupam:
eles (elas) sabem
que o pouco pra mim
é talvez
e que a intensidade
é uma marca 
que em mim
tem vez.

os deuses (as deusas)
são puro desafio:
quem é que se importa
com a dúvida?
viva a dúvida!
viva a dúvida,
viva a dádiva,
viva a dívida
de bem viver
o que 
tiver
de 
ser!

domingo, 15 de fevereiro de 2015

olhos de azeviche (da série: é preciso ter coragem de ser)

ando tão diferente de mim mesma
que às vezes me pergunto se eu sou eu mesma.
dei pra mudar de hábitos
de vícios
de padrões.
dei pra deixar novamente o cabelo crescer
os brincos diminuírem
os horizontes se alargarem
os medos se desminlinguirem.

dei de amar, até,
uns olhos de azeviche -
que nem sei bem o que mesmo
 hão de querer comigo... se é que!

dei de deixar
o que tiver de ser, ser.
dei de deixar de esperar,
de temer,
dei de deixar vingar
o que há muito 
tempo
clama
por 
viver.




quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

baião (da série: da arte da boa vizinhança)

ganhei um doce de mamão
e um doce de banana da minha vizinha.
ganhei feijão.
com ele aprendi a fazer baião
(de dois, ou duas, o que eu sabia
fazer era algo que a mim mesma continha - rs).

fiquei muito feliz
foi com a constatação
de que a arte da boa vizinhança
é um prêmio do qual não se pode ter,
de início, a dimensão:

investimento a fundo perdido,
tudo o que se dá volta revertido
em amizade, carinho, atenção.


quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

consigna de 2015

"o mal é o bem no lugar errado"
(rudolf steiner)

ou dito de outro modo:

"... não há mal do qual não resulte um bem."
(voltaire in Zadig ou O Destino)