O
que vale mais: a coisa ou a representação que a coisa
nos provoca?
Não
sei. Creio que depende muito do momento.
Quando
se trata da infância, no entanto, toda representação é tão
(ou mais) importante que a própria coisa. E assim tem sido
com plantar nos netos (diria mais: no neto, que a pequena ainda está
se aproximando) isso dos ritos. O rito de despertar, de olhar o
próprio cocô, o rito de banhar-se, de escovar os dentes, de
comemorar mas também de se recolher, o rito da leitura (de verdade
ou de cabeça, pouco importa) antes de dormir, o rito de
cantar e acalentar, o rito de cozinhar e comer, de se admirar das
coisas bonitas, de reparar na natureza, de ver mas também de não só
ver as imagens que já vêm prontas (televisão, vídeos, celulares,
computadores), enfim.
E
no meio desses ritos todos, o rito de quando chega e quando parte o
Natal. Neste Natal, o pequeno, ao ver esperando por ele a caixa com os
enfeites e a árvore que devia ser decorada, montou sozinho a árvore,
inclusive ligando-a na eletricidade. O que 5 anos já não fazem num
ser humano!
Pois.
E agora, chegado janeiro e chegado o dia 6, combinei com ele de
desmontar, também de forma ritualística, a árvore. O mais lindo
foi que quando não dava mais pra adiar esse momento, ele, como eu,
se emocionou ― e abraçou
a árvore nua (nossa árvore lembra mais as do semiárido que os
pinheiros mais comumente eleitos pra essa época) e dizia: eu
gosto tanto dessa árvore!!! Ri e fiquei feliz com isso, porque
para mim os dois meses em que as luzinhas da árvore iluminam nosso
cotidiano (que coincidem com as luzes que o cristal tocado pelo sol também espalha pela casa) são uma graça por si só ―
e ver o pequeno dar-se conta de que algo muda com esse apagar-se
momentâneo, é já também uma outra graça.
Há
quem ache tudo isso uma bobagem, uma besteira ―
e eu respeito, guardada a distância necessária entre esse modo duro
de lidar com os ciclos e os que eu cultivo. Só penso em quanto não
se perde ao não se alimentar nas crianças o sentimento de
reverência pelos mistérios. Porque é um mistério
(e grande) o Sol girar de modo a, em determinada época do ano,
lançar luz dentro da minha casa ―
e essa luz se espalhar de maneira multicolorida pelos móveis,
paredes, pessoas... Como é um mistério o ter havido pessoas,
os reis magos, que seguiram uma estrela e deram com um menino numa
manjedoura, menino esse aguardado por milênios e cuja passagem por
este planeta até hoje não compreendemos, de fato.
O
que sei é que, tanto quanto possa, eu planto nos pequenos que
me rodeiam esse estado de con.sideração ―
ou seja, de acolher o que o Cosmos nos manda e que a cada ciclo temos
a oportunidade de renovar, como quem cultiva uma semente e a rega e a
cuida e a vê crescer, até que um dia ela amadureça e dê frutos, e
novas sementes ― e assim
siga até enquanto o mundo puder ser.
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