a
mania de por ordem em tudo já afastou muita gente. e ainda afasta.
mesmo os filhos. também, pra que serve mãe depois que se cresce?
talvez, de vez em quando, pra cuidar dos netos. ou pra escutar
queixas de cansaço. quem sabe, pra compartilhar aquilo que ela tiver
quando nada mais restar do que se esbanjou.
por
ausência absoluta de mãe em quase toda a vida, não conseguia dar
essa resposta...
daí
ensaiou imaginar. pode ser que mãe sirva pra gastar seu tempo no que
ela quiser, e não apenas no que é útil. oxalá mãe sirva pra
realizar seus próprios sonhos, e não os de outrem. se se puder ser
um pouco mais condescendente, talvez até mesmo mãe namore, case,
separe, namore de novo ―
ou escolha, à revelia do que impõe a ordem vigente, a solidão não
como castigo, mas como boa companhia.
há
quem diga que mãe serve mesmo quando não serve pra nada: mãe pode
também ser cuidada. maioria absoluta continua achando que mãe é
pra se dar presente no dia das mães ou nas festas de natal ou de
aniversário... nada de tão vário.
poucos,
porém, refletem. refletir é ato raro em tempo louco.
mas
desses poucos, por fim, pode ser que um dia um expedicionário
qualquer, numa escavação de antigas eras (entre drives, dvd's e
restos de uma civilização cibernética) descubra que mãe foi um
dia a origem de tudo. sem mães o mundo simplesmente não existiria.
e que mesmo as mães que nunca serviram senão para nada além disso
(ou seja, para dar à luz a alguém no mundo) são motivo de
reverência e gratidão. esse ser futuro, nascido de si mesmo a
partir de profunda inspiração, pode então recolher todas as
lágrimas, toda a doação, toda a dor que as mães deixaram como
adubo para um mundo onde não sejam mais de fato necessárias.
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